terça-feira, 17 de novembro de 2009

Simão, o vacilão

 

Ninguém sabia explicar porquê. Uns diziam que era a confluência dos astros, outros que era defeito genético, outros ainda diziam que era uma maldição. As teorias variavam bastante, mas nenhuma conseguia realmente explicar porque o Simão nascera deste jeito…peculiar.

Seu primeiro ato de maldade foi aos três segundos de vida. Ao nascer, fingiu-se de morto e não respondeu às palmadinhas do médico, deixando todos em pânico, pra dali cinco minutos começar a chorar (porque ainda não aprendera a rir das suas primeiras vítimas). Ainda bebê, fazia greve de fome e se recusava a tornar as coisas um pouquinho menos complicadas pra sua mãe.

Se as crianças já costumam ser terríveis, imagina só o Simão. Enquanto os coleguinhas se divertiam fazendo travessuras como queimar formigas com lupas, ele usava uma mistura especial de nitrato de amônio que não matava, mas deixava as coitadinhas agonizando em dor por semanas. Grudava chiclete no cabelo das meninas, desenhava bigodinhos e chifrinhos nas figurinhas dos meninos. Uma vez ganhou um hamster de um tio, com aquela rodinha e tudo, mas ele preferia colocá-lo em uma chapa quente e vê-lo dançar forçado a Macarena.

Quando adulto, continuou seu repertório de peripécias. Roubava o jornal do vizinho, mas deixava apenas o caderno Zen, Equilíbrio, Viagens e esses que ninguém lê. Roubava os dízimos da igreja. Dava moedas de Cruzados Novos para cegos mendigos. Saltitava ao lado de pessoas em cadeiras de rodas. Comia chocolate em frente ao Spa. Ia no cinema só pra contar os finais dos filmes. Ouvia tecnobrega em volume altíssimo mesmo odiando as músicas: o prazer de irritar os vizinhos superava tudo.

Quando algum desinformado o convidava pra uma festa de aniversário, ele só levava presentes sacanas: cuecas, lenços, box de DVDs do R.R. Soares, capas pra computador, Cds do Fagner.

Uma vez até arrumou uma namorada pela internet, se fez de bonzinho e resolveu casar com ela. Tudo isso só pelo prazer de abandoná-la no altar, gargalhando e dizendo que era uma baranga.

Era mesmo um chato, um pé no saco, um vacilão. E ele nem ligava.

Um dia, subiu ao apartamento, colocou a comida do peixe (que não comia a uma semana) bem em frente ao aquário. Achou graça de saber que os olhos de um peixe podem se esbugalhar ainda mais. Ligou pra pizzaria e pediu cinco portuguesas e nove margueritas para entregar na casa de uma mulher surda-muda que morava em frente e não conseguiria explicar o não-pedido.

Sentou no sofá, ligou a TV a cabo (o cabo era do vizinho), mas algo devia estar errado com a gambiarra: só pegava a TV Senado. Com preguiça de levantar, deixou-se estar ali por uns vinte minutos. Descobriu que não era o único vacilão do mundo. Tinha gente que roubava dinheiro de pobre, fazia leis em benefício próprio e ainda desmentia tudo. Sentiu-se um amador. Ficou pensativo por um momento, pegou de lado a lista telefônica e copiou um número.

Era o número de um psicólogo.

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